“Morto em 19 de junho de 2019, o crítico de cinema Rubens Ewald Filho entrevistou inúmeras figuras importantes ao longo de extensa carreira. Resgatamos aqui sua entrevista com o cineasta polonês Krzysztof Kieslowski no Festival de Cannes de 1994, quando apresentava a terceira parte de sua Trilogia das Cores, A Fraternidade é Vermelha, também seu último filme. Kieslowski acabava de anunciar sua aposentadoria.
R: Acha que já disse tudo que queria em seus filmes?
K: Não é esse tipo de problema… Eu só estou muito cansado, e, como disse, não sou fã de cinema. É só minha profissão. E se tenho a oportunidade de parar, eu paro.
R: A Fraternidade é Vermelha teve excelente reação de crítica, que amou. Isso pode mudar algo?
K: Gosto que as pessoas gostem de meus filmes, porque faço para elas. Os críticos também são parte do público.
R: Por que você escolheu a Suíça, Genebra, para a ação do filme?
K: Porque é dinheiro francês e é um país que fala francês. Podíamos ter feito na Bélgica, mas preferia a Suíça porque a história pertence a esse país.
R: E as coincidências no filme, personagens se reencontrando. Quase uma marca sua. Por quê?
K: Porque acontece muito isso em nossa vida e notei, vi, senti isso. Por isso coloquei no filme. Todos [os filmes da Trilogia das Cores] são diferentes porque são histórias diferentes. O primeiro é um tipo de drama, uma tragédia até. O segundo é uma comédia, o terceiro não sei classificar, não sei bem o que é, mas os críticos farão isso, dirão do que se trata, eu aprenderei…
R: Vai acreditar neles?
K: Não importa. Mas alguém vai rotulá-lo. Mas eu não posso, não sei.
R: O que faz em seu tempo livre?
K: Nos últimos anos não tive tempo livre. Nenhum.
R: Porque tem se falado muito em sua aposentadoria. Realmente se decidiu?
K: Sim…
R: Você vai se aposentar…
K: Já me aposentei.
R: Mas o que um cineasta faz quando se aposenta?
K: Nada, eu espero…
R: Você vai para sua casa e…
K: Você é brasileiro, sabe disso, você gosta da vida. Eu também… Gosto de usar a vida.
R: Cuidar do jardim? Você tem hobbies?
K: Tudo. Respirar, relaxar… tudo.
A entrevista está no material extra do DVD de A Liberdade é Azul (Versátil Home Vídeo). Kieslowski morreu em março de 1996, aos 54 anos. A Fraternidade é Vermelha saiu de Cannes sem nenhum prêmio. Na ocasião, Pulp Fiction ganhou a Palma de Ouro.”
Retirei o trecho acima de um comentário no Filmow feito pelo usuário Rafael Amaral.